36 voltas ao Sol e as 50 perguntas que podem guiar a tua vida

Acredito que quando alguém faz anos cabe-lhe a si a responsabilidade de dar. Afinal, o que se celebra é a sua vida e essa vida não seria a mesma sem as pessoas que o acompanham. O aniversário é, assim, o momento perfeito para o aniversariante dizer aos outros o quão importantes são para si.

Hoje, completo a minha 36ª volta ao Sol e, por isso, cabe-me a responsabilidade de oferecer algo.

Quando fiz 32 anos escrevi um texto relativo ao meu aniversário. Repeti o processo quando fiz 33, 34 e 35 anos. Hoje, reli cada um desses textos. Gostei de umas coisas, não gostei de outras. É contudo interessante perceber que as minhas ideias principais se vão mantendo ao longo dos anos. Foi bom dar esse rápido mergulho no passado. Dá mais algum sentido ao momento presente.

HB

Este ano, que marca a entrada inexorável na segunda metade da 4ª década de vida, resolvi novamente dar algo. Desta feita, mais do que um texto com as minhas reflexões e uma certa tentativa de balanço da minha vida, resolvi partilhar perguntas.

Compilei algumas das perguntas em que mais penso e que, por isso, mais uso para moldar a minha vida.

Umas são perguntas que me faço há anos e, outras, são perguntas que me comecei a colocar há menos tempo. Não tenho respostas perfeitas para elas nem sei se algum dia as terei, sei apenas que a busca pelas respostas é, em si mesmo, a melhor resposta.

Partilho estas questões porque acho que o mais importante é saber fazer perguntas. Perguntas pertinentes. Perguntas difíceis. Perguntas que que nos fazem pensar.

Num mundo de dedo leve no gatilho das respostas, a arte de parar e questionar é cada vez mais importante. É isso que nos confronta com as nossas escolhas. É isso que nos leva a ponderar o que fazer. São as perguntas que nos levam a avaliar as nossas ações. São as perguntas que nos levam a definir quem queremos ser e onde queremos chegar.

Partilho hoje 50 perguntas. Amanhã, a lista poderia ser um pouco diferente porém, o essencial da minha reflexão pessoal fica traduzida neste conjunto. A tua lista poderá ser parecida ou muito diferente; seja como for, espero que as minhas perguntas te possam despertar algumas dúvidas e até desconforto. Se o conseguir, já me terás dado uma bela prenda neste 36º aniversário.

  1. Foste melhor hoje do que foste ontem?
  2. Estás a trabalhar no sentido de aproveitar as capacidades que tens?
  3. Tens verdadeiros amigos? O que tens feito para aprofundar a relação com eles?
  4. De que tens medo? Porquê?
  5. Estás a lutar contra os teus medos?
  6. Sabes em que é que te distingues dos demais?
  7. Trabalhas no sentido de potenciar aquilo em que és naturalmente bom?
  8. Tens dado graças por tudo o que tens ou focas-te no lado mau das coisas?
  9. O que tens feito para ajudar os outros? Como podes aumentar de forma exponencial esse teu contributo?
  10. Consegues estar no momento presente e desfrutar, apreciando a jornada enquanto percorres o caminho?
  11. Dedicas tempo de qualidade às pessoas de quem mais gostas?
  12. Poupas o dinheiro que deves poupar?
  13. Sabes quanto dinheiro precisarás de ter acumulado no dia em que deixares de trabalhar?
  14. Tens algum ódio de estimação? Vale mesmo a pena?
  15. És alvo de críticas? Se sim, são justas? Se não, estarás a fazer algo de suficientemente marcante?
  16. Que legado queres deixar?
  17. És um bom exemplo para uma criança?
  18. Desistes quando o trabalho fica realmente difícil e onde acrescenta real valor?
  19. Esta semana meditaste? Estás a fazê-lo de forma disciplinada?
  20. Conseguiste proporcionar contextos de complexidade crescente àqueles que trabalham contigo?
  21. Deste os parabéns merecidos à tua equipa?
  22. Os teus pais têm orgulho na pessoa em que te transformaste? E tu?
  23. Continuas preso aos problemas do passado ou aceitas o que viveste e olhas em frente?
  24. Aprendeste alguma coisa relevante hoje? E ontem?
  25. Ensinaste alguma coisa a alguém?
  26. Se as pessoas de quem mais gostas morressem, o que te restaria?
  27. A morte está mais perto a cada dia. Lembras-te todos os dias que o tempo é o bem mais precioso?
  28. Estás a viver a tua vida ou apenas a fazer aquilo que outros esperam que faças?
  29. Pensas pela tua cabeça ou és um joguete na mão de outros?
  30. Esforças-te para entender a perspetiva do outro ou fechas-te na tua?
  31. Dás contigo a queixares-te e com auto-comiseração?
  32. Quantas pessoas novas e que aportaram algo de positivo conheceste no último mês? Quantas conhecerás no próximo?
  33. Respiras 3 vezes antes de explodires num ataque de fúria?
  34. Ofereces aos outros aquilo que te faz mais falta ou só ofereces aquilo de que não gostas?
  35. Começas cada dia com um sorriso e a vontade de viver um dia inesquecível?
  36. Continuas a ter prazer com o teu trabalho?
  37. Estás a viver de acordo com os teus valores?
  38. Transmites boas vibrações ou afastas os outros?
  39. Quando afastas os outros, será sempre culpa deles?
  40. Medes a tua felicidade pela quantidade de likes nos teus posts?
  41. O que estás a fazer para produzir novas ideias, ideias transformadoras?
  42. Alocas tempo ao que é mais importante ou perdes-te em tarefas infinitas e sem qualquer valor acrescentado?
  43. Se fosse hoje o último dia da tua vida, partirias em paz, com a noção de teres vivido uma vida digna?
  44. Testas coisas novas ou só percorres trilhos já percorridos?
  45. Dizes “não” todas as vezes que devias?
  46. És bem-sucedido? Sentes-te realizado? O que estás a fazer para não seres bem-sucedido e miseravelmente infeliz?
  47. Quando ponderas fazer algo novo e desafiante, pensas no que é o pior que te pode acontecer? É assim tão mau? Justifica não arriscar?
  48. Estás a perseguir coisas realmente grandes ou perdes-te em caminhos pouco mais que irrelevantes?
  49. O Ego é, muitas vezes, o teu maior inimigo. O que estás a fazer para o controlar?
  50. És feliz?

Deixo um abraço de agradecimento por me acompanhares em mais esta volta ao Sol,

 

Hugo Belchior

PS. Há muito pouco tempo conheci a música do Daniel Martin Moore. Pese embora ainda a não ter explorado muito, há uma canção que vem a propósito e que recomendo: Golden Age. Aproveitemos cada Golden Age que vivemos.

Um telefonema pode valer milhares de euros

Há cerca de 2 anos sentia que tinha que aprender mais sobre marketing digital e sentia que tinha que começar a direcionar alguns recursos no sentido de preparar um ajustamento do modelo de negócio da minha empresa de formação, a Bwizer, rumo ao digital.

Sem grande método de pesquisa, ia navegado na Internet e, ao procurar coisas em português, fui naturalmente ter ao Brasil e fui-me apercebendo que estava a emergir (ou tinha emergido não há muito tempo), uma dinâmica muito interessante no mundo do marketing online. No meio desse processo fui entrando em vários funis de venda.

A certa altura deparei com o Congresso de Afiliados (seria a edição 2.0?) e com o Victor Damásio. Como estava no seu funil e fui vendo o conteúdo que ia sendo disponibilizado, comecei a interessar-me mais. Não que me imaginasse a ser um afiliado mas porque o conteúdo do congresso me parecia bem adequado para aquilo que então procurava.

Foi então que, num princípio de noite, já em casa, fui seguindo os passos no sentido de fazer a aquisição do produto. Estava decidido a comprar até que, no momento em que ia pagar e o valor final me apareceu em Euros – mais de €300 – parei! Tinha errado o cálculo do câmbio e esperava não pagar mais de cento e poucos euros e, afinal, o preço era bem superior.

Parei o processo, abandonei o carrinho e fui refletir um pouco mais enquanto jantava.

Passados uns minutos o meu telefone tocou. Era um número não identificado e, apesar de muitas vezes não atender números privados, naquele dia atendi. Do outro lado, surpreendeu-me uma voz brasileira, uma voz que já tinha ouvido:

– Hugo, olá. Daqui é Victor Damásio, do Congresso de Afiliados. Tudo bom?

Estava a achar aquilo um pouco bizarro e lá titubeei um “Olá Victor”. E o Victor continuou:

– Queria apenas que soubesse que, deste lado, está alguém de carne e osso. Não se trata de uma qualquer coisa sem rosto humano. Não; eu estou aqui para o que precisar.

Achei genial mas, ainda lhe disse.

– Mas, Victor, eu não concluí a compra…

Do outro lado, com aquela maneira rápida de falar, mas bem articulada, o Victor respondeu.

– Não tem problema cara. Eu vi aqui uma entrada no carrinho vinda de Portugal e resolvi ligar para agradecer o seu interesse.

Despedimo-nos.

Fiquei uns segundos a pensar que aquilo era um gesto de grande preocupação com um potencial cliente – foi a primeira grande lição que aprendi do Victor e, uns segundos depois, concluía a minha compra do Congresso de Afiliados…

Aquele telefonema foi o clique que precisava para efectuar a minha compra e, depois dessa, fiz várias outras, num total de alguns milhares de euros.

Independentemente do intuito comercial que pudesse existir, o simples facto de alguém se preocupar ao ponto de pegar no telefone e fazer uma chamada, sem sequer tocar no assunto “venda”, apenas transmitindo preocupação com o cliente e conectando com ele, foi poderoso. É poderoso!

E você, faz coisas dessas no seu negócio? Teste e veja o que acontece e diga-me!

Entretanto, o Victor Damásio passou por Portugal e aproveitei para o entrevistar. Foi um momento especial e que resultou em muito conteúdo relevante, que lhe pode ser muito útil, acredito.

Convido-o(a) a ver a entrevista e a dizer-me o que achou.

Thumbnail Victor Damásio.jpg

Um abraço do,

Hugo Belchior

Atingir metas vs Realização pessoal

Acredito no valor das metas e dos objectivos. Faróis que guiem as nossas acções e canalizem a nossa energia. O problema é se atingimos as nossas metas e os nossos objectivos mas, sem realização pessoal. É que uma coisa não está obrigatoriamente ligada à outra. Procuro alinhar cada vez mais as duas coisas. Isso implica saber o que me realiza e, depois, transformar esse caminho em objectivos e metas. É um processo sempre inacabado mas um processo que, só por si, já é útil.Realização

35ª Volta ao Sol

35.

Faço 35 anos e lembro-me dos meus 15, altura em que recordo ter começado a ganhar percepção de mim como um ser com consciência plena. E recordo os 20, idade com que comecei a trabalhar. Recordo os 25, quando iniciei a minha vida empresarial. Lembro-me dos 28, onde senti começar a ganhar uma respeitabilidade diferente. Não me lembro da passagem dos 30; não me marcou nada. Lembro-me dos 33, quando as coisas parece que começaram a encarreirar. Hoje, completo 35.

Não há muito tempo, consideraria alguém desta idade, se não um velho, no mínimo alguém de uma geração bem longínqua. E, de repente, sou eu que cá estou.

HUGO35

Já pensaste no que se pode fazer numa viagem de 35 anos?

Com 35 tens talvez memória dos teus pais com a tua idade actual.

Já pudeste fazer vários amigos ao longo de fases diferentes, mas guardar sempre aqueles 3 ou 4 realmente verdadeiros, aqueles que testemunham a tua vida e lhe dão mais sentido. Ao longo de 35 anos já tiveste tempo para ir afinando o teu lugar no mundo, ajustando aquilo que fazes àquilo que queres fazer. Talvez não.

Já tiveste o tempo suficiente para ter iniciado uma carreira e até de ter mudado mais que uma vez. Talvez ainda não tenhas começado nenhuma e dás-te conta que há pessoas da tua idade com 15 anos de avanço. Ou, se calhar, o avanço é teu, que escolheste um caminho diferente.

Se fores trabalhador, já trabalhaste milhares de horas. Se tudo correr bem, já começaste a ver os frutos desse trabalho.

  1. É tempo suficiente para conhecer várias mulheres. Ou homens. Para amar, ser amado, sofrer, magoar. Muitas vezes ou talvez só uma. Sorris ao lembrar algumas histórias e coras a pensar noutras.

Com 35 anos talvez já tenhas viajado. Pouco ou muito, já concluíste que com o tempo que te resta e com tudo que tens para fazer, será impossível ver tudo o que gostarias.

Aos 35 anos a percepção do tempo é agora de uma forte voragem, deixando há muito para trás a sensação de tempo que não passa. A rapidez do tempo traz já alguma angústia e obriga-te a decisões mais conscientes.

Aos 35 poderás já conhecer melhor os teus defeitos. E, alguns, teimosamente, insistem em por cá ficar. Vais tendo alguma noção daquilo em que és melhor do que a média e, lamentavelmente, é em tão poucas coisas que fica claro que morrerás um dia como um ser brutalmente imperfeito.

Com 35, grande parte dos teus amigos estarão casados. Ou estiveram. E tu? Têm filhos. Pensas nos filhos que não tens, se os não tens. Pensas se gostarias de os ter. Se não serás demasiado egoísta para isso. Se o teu legado passará por aí.

Que legado queres deixar?

Aos 35 tens talvez dinheiro suficiente para algumas decisões mais livres ou então, estás enterrado em compromissos financeiros e essa liberdade é bem menor do que gostarias porque, afinal, também tu te deixaste aprisionar na jaula do crédito.

Tens seguramente forma de ainda mudar uma série de coisas mas sabes que já não tens o mesmo tempo que tinhas quando tinhas 23.

Aos 35 anos já viste partir pessoas de quem gostavas. Alguns, porque foram envelhecendo outros, mais dolorosos, da tua idade ou até mais novos. Ficarão para sempre jovens, e sabes que tudo é fugaz e efémero. E bonito.

Com 35 já coleccionaste alguns ódios de estimação. E talvez tenhas os teus. Terás também os teus admiradores e alguns nem os conhecerás.

Ao 35 já foste injustiçado várias vezes. E foste injusto outras tantas. Aos 35 ainda tens energia juvenil mas o custo de uma noite longa é maior do que imaginavas tão somente há uns anos atrás, e pensas 3 vezes antes de uma noite de copos porque a recuperação tem um custo demasiado alto.

Aos 35 pensas estar relativamente à vontade com a tecnologia e depois olhas para a tua sobrinha de 4 anos e ficas espantado com aquele dedo digital e não tens dúvidas que rapidamente saberá mais do que tu.

Estarás no auge das tuas capacidades mas aparecem alguns miúdos de 20 anos – até já topaste um ou dois – mais espertos do que tu e que, se calhar, ainda vão ser os teus chefes.

Já sabes o suficiente para saber que há “amigos” que se aproximam de ti não pelo que és mas pelo que crêem poderes proporcionar. Ficas mais desconfiado. Espero que mais confiante, também.

Poderás ter as tuas cicatrizes e essas cicatrizes poderão ter-se transformado em adoráveis marcas distintivas ou então, em carapaças rabugentas. A escolha é tua, até porque já não tens idade para dizer que, quando bates com a cabeça na porta, a culpa foi da porta.

Aos 35 começas a ver os 40 a espreitar e pensas que, pelo menos até aos 50 ainda tudo estará bem. Temes que possa não ser assim.

Aos 35, a tua família alargada talvez comece a ter uma nova geração. Os teus primos, compinchas de brincadeiras parvas, afinal também cresceram. Voltam as crianças aos Natais. Outra geração começa a desaparecer e és confrontado com a violência do envelhecimento e da cruel perda de capacidades que traz.

Com 35 já choraste e já riste. Talvez tenhas chorado mais e rido menos. Talvez o contrário.

És, em grande parte, responsável pela forma como queres gerir as vitórias e as derrotas e, mesmo que queiras negá-lo – poderás achar que é mais fácil – sabes que é verdade. Poderás saber que não queres passar a vida preso no “vale das (auto) desculpas” mas dás-te conta que, volta e meia, andas a passear por lá.

Aos 35 já conheceste muitos escroques. E conheceste alguns heróis. Daqueles heróis a sério, que ninguém valoriza. Aqueles que, de alguma maneira, abdicaram do egoísmo hedonista de viver a “sua” vida, para se entregarem a cuidar de alguém mais frágil. Ou aqueles que mantêm sempre um doce sorriso apesar das amarguras cruéis da sua vida.

Afinal, a tua vida não é assim tão complicada.

Com 35 já tomaste decisões difíceis. Numas, acertaste. Noutras, não. Aprendeste sempre, se tiveres sido inteligente. Nem sempre foste.

Encontras de vez em quando colegas da escola e fica claro que as vidas divergiram de forma incrível mas que aqueles laços adolescentes ficam para sempre. Pelo menos enquanto recordam o passado.

Se tens 35 anos tens fotografias velhas em casa, das verdadeiras, talvez um pouco carcomidas pelo tempo e sorris a ver as roupas largas que a tua mãe te comprava e a constatar que os natais não eram ainda uma luxúria de brinquedos. Luxúria de que terias gostado na altura.

Com 35 ainda poderás ter ainda a ilusão de um corpo de atleta e talvez até o tenhas, mas também constatas que a biologia é como é, e que talvez tenhas que admitir que nunca vais ser tão bonito ou elegante como sonhavas aos 17. Ou talvez tenhas mais charme do que nunca.

Com 35, terás vivido pouco menos do que metade da tua vida estatística. Mas sabes que a estatística pode ser uma merda e que podes já ter vivido 80%. Ou até 90.

A tua vida profissional mais produtiva só terá mais 15 anos. Talvez 20. Mesmo que sejam 25, já percebeste que isso passa num instante. Poderás, ainda assim, estar a adorar o teu trabalho e viver cada dia com genuíno prazer mesmo que sabendo que o relógio não pára, até porque já sabes que um prazer não deixa de ser um prazer só porque não é um prazer para sempre.

Aos 35 anos já sabes que as coisas são mais bonitas se partilhadas. Poderás ter ou não com quem as partilhar.

Poderás morrer amanhã, ou até hoje, e sabes que isso será uma pena porque há tanto por viver mas, se isso acontecer, o teu último pensamento será de que já valeu tanto, mas tanto, a pena!

 

Obrigado por me acompanhares em mais uma volta ao Sol.

 

Hugo Belchior

Seria possível escrever a “melhor tese de doutoramento do mundo” sem emigrar?

Ora aqui vai um post que vai contra o pensamento reinante.

O discurso mais consensual parece ser o de criticar o país, desde logo os políticos, por “não darem condições” a todos os portugueses cá pela velha pátria, “forçando” uma série deles a partir. Tudo isto, sistematicamente, com tom azedo e que encerra uma perspectiva de um país fracassado. É a velha falta de oportunidades, naturalmente vítima da falta de estruturas, de investimento, de vontade! No fundo, tudo consequência de meras opções políticas…

Tirando quem tenha motivações políticas, o que é legítimo ter, custa-me entender este discurso, pelo menos na forma como tipicamente aparece colocado: as pessoas não querem emigrar/ as pessoas têm que emigrar para sobreviver-prosperar/ as pessoas partem invariavelmente destroçadas/ o país devia ter vergonha de ser um país assim/ a culpa é dos políticos, que não “dão oportunidades” a todos/ ainda por cima, muitas vezes, o emigrante é alguém “muito qualificado”.

Emigrar

Neste momento, um português está a ser notícia por ter recebido o Heizer Best Dissertation Award da Entrepreneurship Division da Academy of Management, “considerado o prémio mundial mais importante na área de empreendedorismo”. Este português é o Sérgio Costa e é um amigo. E está, naturalmente, de parabéns.

Como é um amigo, fui seguindo uma série de links que noticiavam o facto. Nestas coisas, é sempre curioso dar uma espreitadela nos comentários que agora, livremente, cada um pode deixar em cada notícia. E se, tipicamente, os comentários são positivos, de felicitação e de satisfação por este reconhecimento de um compatriota, lá vem sempre, aqui e ali, um comentário que toca na emigração e no facto de “muito provavelmente, aqui estar um candidato a emigrar, porque este país, seguramente não lhe vai dar condições de trabalho”.

A vontade de escrever este texto surgiu precisamente por ver esses comentários. Não creio que façam sentido e digo porquê.

No caso concreto do Sérgio Costa, aquilo que as pessoas que fazem os comentários diabolizando a emigração não saberão é que o doutoramento do Sérgio Costa e, portanto, a sua tese, foram obtidos numa universidade escocesa. Portanto, o Sérgio Costa, para obter este reconhecimento, esteve fora do país!

E, qual é o problema disto?! Será que é legítimo achar que cada universidade portuguesa, maior ou mais pequena, consegue oferecer condições de investigação que permitam atingir excelência a todos que lá colaboram? Não se pensará que a excelência tem um efeito centrípeto, atraindo mais recursos, mais cérebros, mais visibilidade e assim, permitindo potenciar a espiral de crescimento?

E não é lógico pensar que quem tem mais ambição quer estar em ambientes mais competitivos? E, aliás, se é ambicioso, se quer algo maior para a sua vida, não se trata de querer estar em ambientes mais competitivos e com maior competência, trata-se de TER que estar.

Há, portanto, uma certa ingenuidade quando se fala da emigração de muitas pessoas. Porque, ainda que também elas tenham que sacrificar algo ao saírem do país, elas buscam melhorar a sua vida e isso é motivação mais natural e legítima de um ser humano.

Mas não pensemos que isto se aplica só a pessoas altamente qualificadas. Recentemente liguei a um familiar e, para minha surpresa, estava na Holanda. A trabalhar! Tinha sido contratado por uma empresa com sede na Bélgica (ou seria Luxemburgo?) que depois presta serviços a países ali à volta. Esta pessoa tem baixas qualificações mas em Portugal estava a trabalhar e não estava sequer em risco de desemprego. Mas então, porque emigrou? A resposta é simples: quer melhorar a sua vida. E quer fazê-lo a um ritmo mais rápido do que o conseguiria fazer em Portugal.

E isso é mau? Isso é sinal de um país que maltrata os seus? Não creio! É sinal de gente que quer o melhor para si e o procura. E isso é de louvar.

Está claro que há situações dramáticas, de pessoas que, apesar de todo o esforço, não conseguem arranjar meio de subsistir em Portugal, restando-lhe sair do país e encontrar um meio de subsistência lá fora. Não nego que haja situações muito duras. Só não creio que a avaliação que tipicamente é feita da emigração e da culpa dos políticos e da “vergonha de país” tenha muito a ver com isto.

Sou o primeiro a achar que a forma como a nossa sociedade está organizada e, por arrasto, a forma como o poder político se expressa, são culpados, pelo menos em parte, pelo nosso atavismo cultural e económico contudo, não tenho qualquer pretensão de achar que o papel dos políticos é o de “dar” oportunidades a todas as pessoas, independentemente das opções, livres, que cada um foi fazendo.

Se sou médico dentista em Portugal, entro no meu curso já a saber que o mercado está bastante saturado e, ainda assim, tomo essa decisão – legítima – e no fim tenho dificuldade de emprego, pelo menos “emprego tradicional”, por que razão não há-de ser a emigração uma opção legítima, positiva e nada indicadora de qualquer falhanço pessoal ou da sociedade portuguesa?

Já antecipo as críticas: Portugal “devia” criar oportunidades para segurar todas estas pessoas. Mas, como? Com investimento público, imagina-se. Esquecendo-se porventura que investimento público pressupõe impostos para o financiar. E será que criar emprego para mais investigadores, enfermeiros, dentistas ou seja o que for, é a melhor alocação desses recursos?

Esta conversa sobre a necessidade de investir mais para “segurar”as pessoas é a mesma conversa que há sobre o investimento no interior do país vs o litoral. “Há que investir no interior, dando condições aos jovens para se manterem na terra que os viu nascer”. Não será no mínimo ingénuo pensar que as coisas funcionam assim?

Se quero trabalhar numa empresa grande, será que posso genuinamente pensar que o vou fazer sem sair de Beja ou de Bragança? Se quero evoluir como actor de teatro, posso fazê-lo a níveis elevados sem ir para Lisboa ou Londres? Se quero ganhar títulos internacionais como jogador de futebol e uma grande visibilidade mediática, onde estarei melhor, em Portugal ou em Espanha ou Inglaterra? Obviamente, poderia dar exemplos sem fim, ilustrando a ideia de que mudar para um mercado mais rico é, apenas, uma decisão lógica e nada tem de mal. E que, goste-se ou não, não é algo que se poda mudar por meras decisões governamentais, por mais que muitos fantasiem com o contrário.

Mas quererá isto dizer que os zonas periféricas como é Portugal quando comparado com o centro da Europa ou como é o interior português quando comparado com Porto e, sobretudo, Lisboa, não têm hipótese de sobreviver? Claro que não. Têm é que se centrar naquilo que as diferencia, em vez de procurarem (e se iludirem com a ideia) de ser cópias baratas e pindéricas das zonas maiores e mais ricas.

Lisboa nunca será um centro financeiro capaz de competir com Londres contudo, tem singularidades que lhe podem permitir atrair gente competente, mesmo a nível internacional, em vários domínios. O Porto nunca será Veneza mas a sua genuinidade e esforços concertados, tem feito do turismo um êxito extraordinário. E se o Alentejo não tem a densidade populacional de Lisboa, tem algo que será cada vez mais importante à medida que nos tornamos num mundo cada vez mais urbano. Tem espaço e ar fresco para respirar, um bem escasso que será cada vez mais valorizado.

Oportunidades para indivíduos e instituições não faltam, haja a capacidade de acrescentar valor sustentadamente agora, pensar-se que podemos replicar aquilo que de melhor se faz em cada área, em Portugal, isso é ingénuo e não leva a lado nenhum.

Não ficamos contentes por Portugal ser o destino preferido dos idosos franceses para viverem? também eles são emigrantes dos seus países, curiosamente…

Quer-se que os políticos façam alguma coisa bem feita? Pois bem, podem começar por simplificar a burocracia ligada ao turismo de saúde, por exemplo. Podem potenciar a concorrência, eliminando bolhas de proteccionismo.

Seria possível escrever a melhor tese de doutoramento do mundo sem emigrar? O Sérgio Costa teria, no Porto, no Algarve ou em Glasgow, a mesma massa cinzenta, isso está claro. Mas, provavelmente, na ausência de todo aquele contexto, o resultado final não poderia ser tão brilhante.

Eu nunca emigrei. Faço algumas incursões profissionais pelo estrangeiro mas não mais. Talvez seja isso que me esteja a faltar, para um novo salto em frente. Não sei se o farei algum dia, se o considerarei uma decisão adequada no meu contexto pessoal contudo, se o fizer algum dia, não o farei zangado com o país (talvez sim com a sua carga fiscal e a sua legislação asfixiante). Mas se tiver a certeza que emigrar é uma boa opção para mim e, ainda assim, não me mexer, bem posso ficar zangado com uma pessoa. E essa pessoa, serei eu.

Minimizar risco ou potenciar retorno?

O adágio popular é claro, “quem não arrisca, não petisca”, e traduz a forma como são as coisas: quem não assume qualquer risco, não pode esperar qualquer retorno, muito menos retornos acima da média.

Se isto me parece indiscutível, pode já haver mais dúvidas sobre aquilo que deve ser a postura de um investidor, seja “mero” investidor financeiro, seja um empreendedor: maximizar o retorno potencial, assumindo riscos superiores ou, antes de mais, garantir que não perde, gerindo assim o seu risco?

Perfis diferentes de risco levarão a posturas diferentes, naturalmente. Todavia, e apesar de isto ser verdade, penso que um qualquer investidor que tenha uma visão de longo prazo, privilegiará sempre a gestão do risco, assegurando que, antes de ganhar, não perde. Está claro que, idealmente, se deve fazer uma gestão de risco tal que, minimizando as perdas, potencie de forma assimétrica os ganhos contudo, insisto, mais do que maximizar ganhos extraordinários, a primeira preocupação de um investidor deverá ser a de minimizar o risco de perdas.

Resolvi partilhar estas considerações depois de ver um vídeo em que caçadores Masai roubam carne a um grupo de leões. E tudo isto sem qualquer confronto, fazendo uso de uma atitude decidida e de uma execução rápida e sem falhas.

Por que razão se afastam os leões? Por instinto de sobrevivência, minimizando as perdas potenciais, a vida, ainda que à custa da recompensa da sua caçada, o alimento.

Poderá pensar-se que os Masai optam por uma estratégia completamente oposta, maximizando o risco. Não é verdade. E não é verdade, desde logo porque se trata de uma prática ancestral e que cada um daqueles homens seguramente já levou a cabo várias vezes. Eles sabem, com suficiente probabilidade, qual será a reacção dos leões à sua aproximação, e saberão também qual o tempo que têm até os leões se aperceberem que o perigo afinal não existe e que podem facilmente reclamar o seu alimento.

É bem provável que este conhecimento se tenha acumulado à custa de algumas vidas Masai mas, já diz o povo, “quem não arrisca, não petisca”!

Mudei de vida

mudar de vida

Já alguma vez sentiu que aquilo que estava a fazer não o preenchia verdadeiramente? Já passou pela experiência de olhar para o futuro e aquilo que vê não é o que realmente quer? Já acordou sem vontade de trabalhar, sentindo-se angustiado ainda antes de sair da cama?

Eu já! E por isso decidi mudar de vida.

Por um conjunto de razões que hoje não cabem aqui, tirei o curso de fisioterapia. Convém dizer que foi a minha primeira escolha. Gostei do curso e tive uma performance académica bastante boa. Aliás, fui o melhor aluno da minha turma e recebi até um prémio que, curiosamente, acabei por nunca reclamar.

Comecei a trabalhar como fisioterapeuta aos 20 anos. Era muito novo. Dois fenómenos ajudaram a esse facto. O primeiro, é que como tinha iniciado a então escola primária com 5 anos e não 6, estive sempre um ano adiantado. O segundo, é que na altura era-se Fisioterapeuta, apto a trabalhar, ao fim de 3 anos de curso. O 4º ano fi-lo já a trabalhar, em regime pós-laboral.

Pois bem, lembro-me que um dia, no final da jornada de trabalho parei, reflecti no dia que terminava, nos anteriores, nos futuros, e senti angústia. A realidade revelou-se-me de forma clara e dura: não queria fazer aquilo o resto da minha vida. Aliás, não estava seguro que o quisesse fazer muito mais tempo! Penso que isto sucedeu pouco depois do primeiro mês de trabalho… Convém também referir que para 20 anos e recém-formado, o vencimento que auferia era bastante simpático, sobretudo quando visto à distância dos anos.

As semanas passaram e tive que mudar de emprego porque onde estava não era compatível com o 4º ano do curso, que estava prestes a iniciar. O 2º local onde trabalhei foi a machadada final. Detestei realmente trabalhar lá. E aí, por vezes, acordava sem vontade de trabalhar, frustradíssimo. Apesar disso, nunca faltei. E não duvido que fiz um trabalho sério e profissional. Mas, sem prazer.

O mundo é dinâmico – felizmente – e isso abriu-me a possibilidade de mudar de novo de emprego. Desta feita, trabalhava num gabinete de fisioterapia de referência da cidade do Porto e isso aplacou um pouco o meu desejo de mudança de vida. Aplacou mas não o eliminou. Definitivamente, apesar de gostar muito da fisioterapia – ainda hoje gosto – ser Fisioterapeuta “clínico” não era o meu caminho.

E quanto mais o tempo passava, mais isso ficava claro. Fui dando ouvidos à minha voz interna e ficou claro que o que me apaixonava e punha a sonhar era o mundo dos negócios. Apercebi-me, inclusivamente, que era algo que já me acompanhava desde adolescente mas ao qual nunca tinha dado ouvidos de forma estruturada. Todavia, com 21, talvez 22 anos, não sentia que fosse o momento certo para montar um negócio. Pensava que ainda não sabia o suficiente para dar esse passo.

Foi então que decidi fazer um MBA. Decidi, candidatei-me e entrei. E assim, mudei de vida. Despedi-me do local onde trabalhava e entrei na então Escola de gestão do Porto, hoje Porto Business School. Creio que a primeira aula foi a 28 de Julho de 2003. Tinha 22 anos. Era muito novo (demasiado, porventura) e, tanto quanto sei, o primeiro Fisioterapeuta a fazer um MBA em full-time.

O MBA entretanto foi-se aproximando-se do fim e não fazia a mínima ideia do que fazer a seguir. Estava a adorar aprender gestão e ter aquele contacto com empresas e pessoas ligados ao mundo dos negócios e, portanto, queria continuar a aprender. Mas, será que iria conseguir trabalhar em alguma empresa? Para todos os efeitos, era apenas um mero Fisioterapeuta com um MBA, 23 anos e sem experiência em gestão.

Mas então, a minha vida mudou de novo! Tinha entrado num processo de recrutamento para a Optimus e acabei por ser seleccionado. E assim, no dia 2 de Agosto de 2004 (já lá vão 11 anos!), a minha vida girava mais uns graus.

É muito justo reconhecer a abertura de espírito das pessoas que estiveram envolvidas nesse processo de recrutamento, uma vez que contratar um perfil tão diferente do óbvio envolve sempre mais riscos. Essas pessoas foram o Hugo Macedo, colega de MBA que apontou a existência do processo de recrutamento e que depois foi o meu primeiro chefe, o Miguel Tolentino, então nos Recursos Humanos, o Renato Ribeiro, que foi meu chefe directo quase todo o tempo que lá estive – alguém que me ensinou muito, talvez mais do que ele possa suspeitar, e o Manuel Ramalho Eanes, então director da unidade de negócios onde fui trabalhar, alguém com uma inteligência superior e um líder com grande autoridade.

Tive dois anos de uma aprendizagem incrível e de genuíno prazer no trabalho desenvolvido. Foi uma escola muito importante para mim. Uma escola com coisas boas e coisas más mas, indiscutivelmente, marcante. Entretanto, sentia renascer em mim o desejo de lançar a minha própria empresa. Mais do que uma coisa racionalizada, era um ímpeto visceral. Não queria passar a minha carreira inserido num sistema que não tinha qualquer possibilidade de influenciar a um nível realmente impactante. A certa altura comuniquei o meu desejo de sair da Optimus, concretizando-se a saída em Dezembro de 2006.

Mudei novamente de vida: despedi-me, deixando um emprego “seguro” e saltando para uma situação sem qualquer remuneração garantida. Sabia que o risco era elevado. Mas sabia também que, em bom rigor, talvez nunca fosse tão baixo. Tinha 25 anos e toda uma vida pela frente. E havia algo não me deixou vacilar: tinha jurado para mim mesmo que não voltaria estar em nenhum lugar onde durante demasiados dias seguidos sentisse falta de energia ao acordar…

Mudei de vida nesse Dezembro. Sou empresário desde essa altura. É tudo fácil? Nada disso! Arrependo-me? Nem por um segundo me arrependi, mesmo nos momentos mais difíceis que já vivi. É que há outra coisa que naquele dia 28 de Julho de 2003 disse para mim próprio no fim da primeira aula daquele terrível período de homogeneização do MBA (umas semanas de aulas intensivas para quem não tem um background de gestão/ economia ou, pelo menos, um claro background quantitativo), uma aulas em que fiquei bastante apreensivo – para ser eufemístico – com a minha capacidade de chegar ao fim do MBA. E o que disse, e que ainda hoje repito para mim próprio em algumas circunstâncias foi “prefiro o risco de não atingir o que me proponho, do que o risco de arrependimento por não ter tentado”.

Um abraço do,

Hugo Belchior

Casillas, a ingratidão e o valor acrescentado

real-madrid-iker-casillas-despedida-FC Porto

Ao ver a despedida do Iker Casillas, sozinho em frente aos jornalistas, voz embargada, dei comigo a pensar na gratidão.

Ainda que aquilo que escreveu (e depois leu) seja totalmente verdade – não há razão para duvidar – e que tenha aprendido com cada um dos seus treinadores e que, na hora da despedida, agradeça mil vezes, sobretudo aos madrilistas, assim denotando uma racional gratidão, não se terá ele sentido injustiçado e vítima de ingratidão nos últimos tempos, com as assobiadelas no Bernabéu, a perda de algum estatuto que começou com Mourinho, terminando numa saída que, parece claro, não queria?

No lugar dele – ele que tantas alegrias deu a milhões de aficionados madrilistas – quem de nós não se sentiria vítima de ingratidão? Eu, desde logo! E, provavelmente, estaria errado.

A gratidão é um sentimento nobre. E está inculcado na nossa cultura de forma marcada. Por essa razão, a percepção da sua ausência fere tanto, com aquela dor que o sentimento de injustiça sempre potencia.

Acontece que, pelo menos nos negócios – e, num clube profissional, um guarda-redes, pago a peso de ouro, é um activo desportivo – a gratidão, pura e simplesmente, talvez não faça sentido. Pelo menos como moeda de troca comercial.

Então, se a gratidão não pode ser a moeda de troca, qual deverá ser? Simples: o valor acrescentado. O Real Madrid não foi ingrato ao “dispensar” o Casillas; o Casillas é que já não acrescentará o mesmo valor. A dor, no fundo, mais do que a dor da ingratidão, imagino que seja a dor da consciência do auge que passou e que se sabe que nunca mais voltará. A dor de uma nova realidade. Com menos estatuto e, provavelmente, com menos títulos e menos glória. Reconheçamos que não é fácil.

O melhor mesmo, por mais duro que o processo possa ser, é procurar outros contextos onde, aquilo que se acrescenta continue a fazer a diferença, e possa ser valorizado de forma satisfatória. E o Casillas, esse, não deixará nunca de ter o mérito de ter ganhado o que ganhou e de ser um atleta de elite, um verdadeiro génio. Apenas tem que digerir a realidade da passagem do tempo.

Do meu lado, e apesar de (pouco fervoroso) benfiquista, reconheço a magistral jogada de marketing de Pinto da Costa e fico feliz pelo meu Porto (cidade), ficar ainda mais no mapa dos nuestros hermanos inclusive, aposto, da bela Sara Carbonero. A Avenida da Boavista não será a Castellana mas o Manzanares não se compara ao imortal Douro. Vem, Sara, aqui podes ser feliz!

A Oliveira (parabéns avó)

A minha avó paterna, a Avó Emília, faria hoje 103 anos. Em sua memória deixo este texto aqui. Um texto que escrevi há 10 anos.

Oliveira

Sentado numa pedra fito uma oliveira e penso há quanto ali estará. Certamente alguns séculos dizem-me. Mas não quero saber os seus anos. A nossa contabilização não se aplica a uma oliveira.

Penso noutra métrica. Quantas gerações terão trabalhado para que aquela oliveira, ano após ano, continue a fornecer o seu fruto? Levanto-me e toco na oliveira. Sempre que visito um monumento histórico gosto de tocar nas suas paredes. Imagino sempre quantas mãos já lá terão tocado, que vidas transportariam essas mãos e que pensamentos preencheriam essas vidas. Repito o gesto na oliveira. É um monumento. Um monumento ao estoicismo.

O que terá movido os homens que ao longo dos tempos têm servido aquela oliveira, na expectativa insegura do seu retorno?

Penso de novo no suor dos que ali terão trabalhado. Penso nas vidas de todos que, como eu, já tocaram naquele ramo grosso e imponente. Penso nas alegrias que esta oliveira lhes terá dado e nas tristezas que certamente também trouxe.

Quem terá sido o criador daquele ícone? Terá ele alguma vez pensado que um dia alguém tocaria num dos ramos, pensando nas vidas passadas sob a sua oliveira?

Arrogantemente penso no poema de Cesário Verde. Aquele em que o poeta revela o seu desejo paradoxal de viver a simplicidade da vida da camponesa e, simultaneamente, ter a consciência dessa simplicidade. Penso nisto arrogantemente, porque admito que as mãos que comigo terão partilhado o toque daquele ramo terão pensado de forma bem mais simples. Quantos quilos dará esta oliveira? Será o azeite de boa qualidade?

Na minha arrogância quase não vejo que foram essas mãos grossas e calejadas que contribuíram para as minhas mãos citadinas e para a minha abstracção improdutiva. Quase não vejo que sob aqueles ramos e sobre aquela terra que pisada solta um ruído incrivelmente sedutor, passou o esforço estóico de muitos dos meus. O estoicismo de alguém que, eventualmente, mesmo sem conseguir filosofar sobre as suas acções, sentia a força de uma necessidade superior de continuar, ano após ano, lavrando, adubando e amando a oliveira. A força da razão mais pura está ali. A necessidade de o homem vencer e de o homem se vencer. Nunca saberia o pai da oliveira que séculos depois alguém pensaria na oliveira como um símbolo do esforço estóico de gerações de homens. O que sei é que aquele pai sabia que tinha que plantar aquela oliveira, cuidá-la e amá-la para que o seu fruto fosse alimentando os sonhos crescentes dos seus filhos e netos por nascer.

Parabéns, avó.

O emprego mudou. Uns adaptam-se, outros não.

O mundo mudou. A revolução digital é incontornável e encerra enormes desafios. Às economias e, claro, a cada trabalhador.

O modelo de trabalho para o qual grande parte de nós foi preparado – e os nossos pais, mais ainda – é um mundo em extinção. Podemos vociferar contra os impactos destas mudanças, sabendo que isso as controlará tanto como parar o vento com as mãos, ou podemos procurar entender o que se passa e percorrer um caminho de adaptação à realidade. E, ajudar os outros a percorrê-lo.

Cada revolução faz as suas vítimas, não vale a pena iludirmo-nos. Não temos é que ser nós essas vítimas. Pelo contrário! Se é verdade que esta revolução traz muitas ameaças, encerra também imensas oportunidades.

E estão aí, para serem exploradas!

Para ilustrar algumas destas ideias de forma bem mais eloquente do que eu consigo fazer, convido a investir pouco mais de 8 minutos para ver o Seth Godin a deixar tudo mais claro. E o vídeo já nem é novo e, portanto, se só hoje estiver a tomar contacto com este tema, lamento mas já está um pouco atrasado. Mas, calma, ainda nada está perdido!